Notas de um participante: Os tesouros no baú de um Grupo Comunitário!

Por Aline Cristina Dadalte
Parable of the Hidden Treasure (Parabole du trésor caché), c. 1630, Rembrandt van Rijn or Gerrit Dou

As experiências com o Grupo Comunitário mostraram-me que ele é uma espécie de “caça ao tesouro”. Uma busca na qual encontro preciosidades, seja na dor, seja na felicidade e estes achados são muitas vezes inusitados, mas sempre ricos, muito ricos!

Em um de nossos encontros, seguindo o mapa do tesouro, descobri algumas joias. Numa lápide – isso mesmo numa lápide! – Uma participante relatou que a falecida deixou um “tesouro”, uma receita de bolacha, mas não era qualquer receita… era AQUELA receita que alguém não poderia morrer sem deixar para o mundo. Essa experiência fez a participante refletir: o que EU vou deixar de precioso para o mundo? Pensei que seria especial fazer aquela receita para meus amigos e contar sobre esse relato que aconteceu no grupo.

Alguns passos adiante, deparei-me com o livro dos abraços de Eduardo Galeano que ajudou um dos participantes a fazer uma experiência sobre olhar, pois não basta ver, tem que olhar e ainda, por vezes, precisamos de alguém que nos ensine a fazê-lo. Olhar é diferente, quando olho, reparo, vislumbro, descortino, sozinha ou acompanhada… Mais uma pérola para minha coleção.

E havia mais… muito mais! Um vídeo de um filho barbeiro cuja mãe doente precisava raspar o cabelo e, num ato de amor, ele começa a raspar a si mesmo… imediatamente um de seus amigos, num gesto precioso, também começa a raspar a própria cabeça! E eles, naquele salão, apoiando-se, amigos e mãe! Esse vídeo ajudou a participante a se ver como mãe e às suas relações familiares e de amizade. Ajudou-me também a ver a amiga que sou em um desses momentos, quando a vida nos prega uma peça. As experiências dos participantes vão deixando estes brilhantes pelo caminho, vão abrindo novas experiências, como o mapa do tesouro que a cada descoberta revela outras pistas, outros caminhos a percorrer.

Assim, nesta trilha de descobertas, mais uns passos adiante, sou presenteada com uma experiência de um abraço inesperado. A participante tenta se expressar, mas não consegue encontrar uma palavra ao certo para descrever o quanto aquele abraço inesperado tocou-a, busca encontrar uma em que caiba tudo o que sente, tudo o que coube naquele abraço. Senti-me também abraçada, e cheia de vontade de inventar palavras que faltam.

Essas experiências de dores e felicidades que encontramos ajudam-me a olhar para o meu cotidiano e a vê-lo com seus contornos diversos. Aflora em mim um humano que lida de forma mais criativa com elas, ao ponto de as tornar tão preciosas. A maior riqueza, talvez, seja descobrir que as experiências não têm fim e que vou guardando como um tesouro, cada uma delas, juntando dor e felicidade.

O Grupo Comunitário mostra-se exatamente como o que me vem à cabeça quando penso em “tesouro”, não é ouro ou pedra preciosa, mas sim algo que enriquece a alma e inspira o cotidiano. O grupo faz-se “mapa do tesouro”: não sei o que vou encontrar, é a surpresa que se guarda dentro de cada baú aberto para partilharmos generosamente. Cada pequeno tesouro que encontro vou guardando até chegar ao fim… que é sempre o início de um novo caminho. Levamos e deixamos preciosidades para abrilhantar o caminho de cada um.

Você, hoje, já olhou para o seu baú?